Os ciganos, oriundos Rajastão na Índia, integram a nossa nação desde o sec. XVI. Tal como os moçárabes ou os judeus, foram sujeitos a legislação diferenciada. Durante as fases mais sombrias da nossa história, os ciganos foram alvo de legislação cruel, especialmente durante o reinado de D. João III e de Filipe III de Espanha quando foram condenados às galés e as mulheres deportadas para o Brasil para contribuir para o povoamento da colónia. Foram também alvo preferencial da Inquisição, acusados de feitiçaria e práticas anti-católicas.
Já no sec. XX, durante o Estado Novo, aos ciganos esteve vedado o acesso à habitação, sendo alvo de disposições discriminatórias, como a norma da GNR que determinava uma “severa vigilância” às populações ciganas. Apenas depois do 25 de abril, os ciganos puderam começar a viver sob o mesmo regime legislativo que os restantes portugueses.
A Figueira em particular, tem uma comunidade cigana muito autónoma que decidiu ultrapassar as vicissitudes do passado, implementado com sucesso projetos europeus de promoção de políticas de inclusão, em especial no domínio da educação, com resultados no aumento da taxa de escolaridade e no acesso e conclusão de cursos do ensino superior. A autarquia tem respondido positivamente a iniciativas locais no âmbito dos projetos Opré Chavalé, Letras Nómadas ou a Roma TV.
Ao longo destes anos, tive o privilégio de trabalhar com figueirenses ciganos em diversas iniciativas políticas e candidaturas autárquicas. Conheço a ponderação, a determinação e o entusiasmo com que se batem pelo seu futuro. Não podemos, por isso, tolerar práticas discriminatórios que lesam estes nossos concidadãos no acesso à habitação, saúde e educação. Não podemos ser indiferentes aos sapinhos racistas à entrada das lojas ou aos insultos criminosos (incitação à violência, ameaças de morte e de genocídio) de que são quotidianamente alvo nas cavernas do partido de André Ventura nas redes sociais. Como nos mostraram recentemente a Grécia e a Eslováquia, ou ainda o caso Zemmour em França, estas práticas requerem a aplicação de penas severas aos infratores.
Publicado no "Diário as Beiras" - 5 de Novembro de 2020