Share |

MULHERES e 25 de ABRIL

Exmo Senhor Presidente da Câmara Municipal

Exmº Senhor Presidente da Assembleia Municipal

Exmªs Senhoras e Senhores Vereadores

Exmªs Senhoras e Senhores Deputados Municipais

Exmos Senhores Presidentes de Junta

Caras e caros cidadãos

Em nome do Bloco de Esquerda, quero agradecer o convite que nos foi endereçado para estarmos presentes nesta cerimónia, para nós é um gosto enorme participarmos na comemoração dos 42 anos da Revolução de Abril, festejando-se também os 41 anos das primeiras eleições livres e democráticas por sufrágio universal e direto, em Portugal e os 40 anos da entrada em vigor da Constituição da República Portuguesa (aprovada em 1976).

Esta tríplice comemoração é a comemoração dos valores da Liberdade, Igualdade e Fraternidade.

A Revolução de Abril trouxe os direitos dos trabalhadores, o serviço nacional de saúde, o serviço nacional de educação, o direito à justiça e os direitos das mulheres.

Aqui, convém recordar alguns factos:

- Antes da Revolução, as mulheres eram vistas como fadas do lar, mães e companheiras. Poucas trabalhavam fora do espaço privado, e quando tal acontecia, ganhavam menos 40% do que os homens. A lei do contrato individual do trabalho permitia que o homem pudesse proibir a mulher de trabalhar fora de casa, e podia rescindir o contrato junto da entidade empregadora sem que a companheira tivesse uma palavra a dizer.

- Não era possível uma carreira militar, na magistratura ou na diplomacia. As mulheres também estavam ausentes das autarquias, só depois de 1975 surgiu a possibilidade de serem Presidentes de Câmara.

- O direito a casar estava vetado para enfermeiras e hospedeiras de bordo. A mulher não podia viajar para o estrangeiro sem autorização do marido ou do pai. O homem era o administrador dos bens, podia abrir a correspondência da sua companheira com todo o direito. Divorciar nem pensar, mas caso a mulher não fosse virgem na altura do casamento, podia, segundo o Código Civil, ser rejeitada pelo marido. Violência doméstica não fazia parte do léxico.

- Quanto ao direito de voto, até final da década de 60, as mulheres só podiam votar quando fossem chefes de família e possuíssem um curso médio ou superior. Em 1968, a lei estabeleceu a igualdade de voto para a Assembleia Nacional de todos os cidadãos que soubessem ler e escrever. Ora existia uma elevada percentagem de analfabetismo, que atingia sobretudo as mulheres. Não é por acaso, que em 1973, só havia 24% de eleitores recenseados. As mulheres apenas podiam votar para as Juntas de Freguesia no caso de serem chefes de família (por exemplo, viúvas) e atenção tinham de apresentar um atestado de idoneidade moral. Foi preciso a Revolução para as mulheres poderem votar em pleno direito.

Segundo a história, foram homens os estrategas e os obreiros do 25 de Abril, os rostos, os nomes que o povo viu e fixou. Esta ausência do feminino não significa, no entanto, que as mulheres não estivessem com a revolução e que muitas delas não se tivessem envolvido no processo, antes durante e depois. Houve mulheres que sacrificaram carreira, vida pessoal e a própria liberdade para que hoje tenhamos um país livre e democrático. Estiveram sempre presentes, mas com um véu de invisibilidade.

Após Abril de 1974, quebraram-se tabus, preconceitos, a mulher saiu à rua, nasceu a mulher cidadã. Esta participação feminina deu origem a vários movimentos: o Movimento pelo Divórcio, o Movimento de Moradores em que se lutou pelo direito à habitação, a creches para os filhos, mas foi no Movimento Operário que as mulheres se destacaram em centenas de lutas (pelo direito ao emprego, com ocupação de empresas abandonadas pelo patronato, pela exigência de “salário igual para trabalho igual”, pelo pagamento de salários em atraso, por aumentos salariais e melhores condições de trabalho (como o controlo das idas à casa de banho).

São elas quem se insurge contra os chamados domingos de trabalho para “salvar a economia nacional”. Tinham que ficar nas fábricas para além da hora do trabalho, assumir responsabilidades nas comissões de gestão ou nas comissões de trabalhadores, lidar com a oposição dos maridos e assegurar ainda o apoio em casa.

A participação das mulheres no pós-25 de Abril, também teve expressão nas ocupações de terras no Alentejo, nas campanhas de alfabetização, nas coletividades de cultura e recreio, nas comissões de base de saúde, traduzindo-se na conquista de uma cidadania feminina anterior às próprias alterações legislativas da Constituição de 1976 e do Código Civil de 1978.

Mas continuavam afastadas da política. Nos sindicatos, onde a luta das mulheres foi fundamental, a média de representatividade feminina, era de 21%. Nas primeiras eleições livres, em 1975 as deputadas representavam 8 por cento. Em 1976, essa percentagem desceu para 5%. Durante 20 anos, o número de deputadas da nação portuguesa nunca ultrapassou uns escassos 9%.

Nas últimas eleições legislativas, pela primeira vez na história da democracia portuguesa, 33% dos parlamentares do BE/PS e PCP e 32% dos deputados dos partidos da direita são mulheres. Sim, o caminho vai fazendo-se, o poder central tem estado atento e tem implementado algumas ações de afirmação positiva. Mas a verdade é que as mulheres representam pelo menos 50% da população, em 42 anos de democracia esperava-se muito mais!

A Constituição da República Portuguesa veio consagrar de forma clara o papel da autonomia local, conferindo-lhe expressão democrática e permitindo às populações assumirem a gestão dos seus interesses próprios. O poder local é, sem dúvida, uma das grandes conquistas de Abril. As autarquias são a forma mais democrática de dar voz a quem está longe do poder central, são elas que podem potenciar a mudança ao nível local enquanto catalisadores da mudança institucional.

O poder local pode promover de forma pró-ativa a igualdade de homens e mulheres, estabelecer um plano que potencie uma maior participação feminina. Para isso é necessária a formação dos quadros e pessoal, tem que haver um compromisso com as políticas de igualdade, terão que ser definidos objetivos realistas, (ninguém está contra ninguém, muito menos contra os homens); há que instaurar um sistema de monitorização da evolução quanto à igualdade de mulheres e homens no município, deve haver uma divulgação da evolução. Há sobretudo que implementar as medidas necessárias à consolidação das mudanças desejadas.

Há razões para as mulheres não participarem politicamente, por não estarem presentes nas reuniões das 6 da tarde ou por se esquivarem das Assembleias Municipais. Uma delas são os filhos, mas também pode ser o transporte do trabalho que chega mais tarde ou o parente que é necessário ir buscar ao Centro de Dia.

A verdade é que, apesar de começar a haver partilha de tarefas, as mulheres trabalham quase o dobro dos homens em casa. É muito raro encontrar mulheres na política, com filhos pequenos ou de um estrato social mais baixo da sociedade. Conseguir políticas inclusivas significa ter em conta todas as barreiras que impedem uma maior participação feminina.

Os Planos de Igualdade de Género são instrumentos fundamentais para promover a igualdade entre homens e mulheres não só nos seus locais de trabalho, mas também em toda uma rede local que deve dar voz a quem merece ser ouvido. Como é possível que, em 2016, apenas 23 mulheres sejam presidentes de câmara e 34 presidentes de assembleias municipais, num total de 308 municípios?

Os partidos políticos devem potenciar a representatividade feminina nas listas de candidatos aos órgãos municipais. As autarquias devem promover políticas que incentivem a participação das mulheres, até porque nos municípios onde estão a ser implementados planos de igualdade de género, o feedback é positivo.

Hoje, em nome do Bloco de Esquerda, quero prestar a minha sincera homenagem a todas as mulheres que participaram no antes e pós 25 de Abril. Um bem-haja pela sua coragem, pela sua luta, pela sua eterna perseverança! Um bem-haja também àquelas que não baixaram os braços e apesar de todos os condicionalismos continuam no poder político, nas coletividades, nas associações, nas iniciativas públicas, a contribuir para que os ideais de Abril não sejam esquecidos!

Viva o 25 de Abril!