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Memória que o mar não leva

Encontrei a ficha do meu avô materno, Aureliano Curado, no portal Homens e Navios do Bacalhau, um arquivo digital do Museu Marítimo de Ílhavo, que documenta as campanhas bacalhoeiras, desde o início do século XX.

Iniciei a busca digitando o nome Curado. 22 entre 29 Curados eram naturais de Lavos, Paião e Figueira. Continuei a minha busca e encontrei o meu tio João Braz e mais uma série de familiares mais afastados que conheceram a vida dura da pesca do bacalhau.

Antes de serem adotadas as técnicas modernas de pesca que conhecemos hoje, naqueles tempos, os pescadores eram largados de um navio em pequenos botes onde pescavam à linha durante horas até regressar ao navio-mãe, por vezes em condições de fraca visibilidade, fustigados pela ondulação, pelo vento e o frio. Muitos foram e nunca mais voltaram.

Outros, entre os quais o meu avô, participaram em campanhas de pesca de bacalhau no Atlântico Norte entre 1941 e 1945, em plena II Guerra Mundial, arriscando as vidas através de rotas patrulhadas por submarinos alemães. Nesse período, a fome falava mais alto e nem a guerra parou a pesca do bacalhau.

Este trabalho do Museu Marítimo de Ílhavo é de um valor inestimável para todas as localidades costeiras que fizeram da pesca o seu modo de vida durante décadas.

É um grande bloco da nossa memória coletiva que é documentado com muito rigor, contribuindo para o justo reconhecimento daqueles que exerceram uma atividade dura, mas que foi fundamental para atravessarmos os longos períodos de fome e pobreza que caracterizaram a primeira metade do século XX.

Convido os caros leitores a explorar este excelente arquivo e a procurar familiares, conhecidos e amigos que participaram na pesca do bacalhau, no sítio: http://mmi.t-t.pt/.

Publicado no LUX24 - 4 de março de 2019