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Universidades-Fundação. Nós dizemos NÃO.

Dez anos depois da aprovação do Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior, e após as experiências das universidades de Aveiro, Porto, ISCTE e da NOVA de Lisboa, a possibilidade da passagem a Fundação paira agora sobre Coimbra. Estas transformações, contudo, não têm passado sem primeiro enfrentarem contestação e resistência. Por Mariana Garrido e Diogo Barbosa.

O RJIES prevê que, caso o desejem, as IES possam funcionar sob um regime de Direito Privado (em alternativa ao atual regime de Direito Público). Essa transformação, que alegadamente oferece a estas instituições autonomia acrescida, traz consigo, no entanto, consequências altamente perversas à preservação do nosso ES público e democrático. O RF faz com que o Estado se demita das suas responsabilidades constitucionais e atribui às universidades o papel de assegurar pelo menos 50% do seu financiamento. Isto leva a: 1) Perpetuação da lógica vigente de subfinanciamento ao ES; 2) Hierarquização das IES segundo as suas capacidades de atração de investimento; 3) Possibilita a contração de empréstimos e abre o perigo inédito de uma universidade entrar em falência. Além disso, numa Universidade-Fundação passa a ser possível fazer-se Contratos Individuais de Trabalho, o que progressivamente substituirá os direitos inerentes às carreiras docentes da função pública por vínculos precários.

O que a passagem a Fundação tem de mais grave é, ainda assim, o afastamento dos estudantes, professores e funcionários dos poderes de decisão. Neste regime, as universidades passam a ser geridas fundamentalmente por um Conselho de Curadores, composto por 5 membros externos à instituição e por norma nomeados pelas suas ligações à indústria, banca e finanças. Este é um órgão antidemocrático, sobretudo por não permitir uma gestão democrática e participada da universidade - como acontece nos atuais Conselhos Gerais, ainda que limitadamente.

É por todas estas razões que dizemos NÃO à Fundação. Afortunadamente, a luta contra a Fundação trouxe consigo grandes oportunidades de mobilização, constituindo o nicho mais forte de movimento estudantil dos últimos anos. Tal como em 1969, nós, atuais estudantes da UC, escolhemos fazer uso da palavra e rejeitar este ataque à gestão democrática da nossa universidade. Hoje, temos a responsabilidade de repudiar a mercantilização do ES: rejeitamos as constantes ameaças que pairam sobre os mecanismos de Ação Social, bolsas, Residências ou Repúblicas; receamos que cursos menos rentáveis sejam preteridos em favor de outros; recusamos quaisquer aumentos de propinas e emolumentos.

Em Coimbra, temos contado com um ambiente de resistência que não passa despercebido: refletiu-se numa forte corrida às eleições ao Conselho Geral; no aparecimento de um Movimento “Não vai ter Fundação”; e, mais recentemente, na criação da Plataforma Anti-Fundação. Estes grupos, acompanhados da imprescindível força do Conselho das Repúblicas, têm levado a cabo debates, manifestações, conversas com membros da comunidade educativa, performances artísticas e demais atividades de contestação à (a)Fundação. 

A 19 Abril, cerca de 500 estudantes deliberaram em Assembleia Magna o repúdio à passagem da UC a Fundação. Espera-se assim, que a partir de agora, também a AAC tome ações mais reivindicativas, não apenas pela UC, mas por uma total revisão do RJIES e do que ele representa.

O caminho é longo, mas como cantava Adriano: “Há sempre alguém que resiste, há sempre alguém que diz não”.

Publicado em "Pão & Cravos" Nº 10 - maio/junho