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Debaixo de algum céu

Sei exatamente como o Nuno pronuncia aquela cedilha de Marco Moço, oiço-lhe a voz ao ler “Debaixo de algum céu”, o romance vencedor do prémio LeYa 2012. Amigo, orientando na Universidade de Coimbra e parceiro de escrita no blogue Klepsýdra, a minha opinião só pode ser parcial. Assim seja.

“Debaixo de algum céu” é uma prosa poética, onde nenhuma frase é deixada ao acaso, uma boa herança da passagem do Nuno Camarneiro pela micronarrativa. A estrutura desta história concentra-se em oito dias e é inspirada no Purgatório de Dante, materializado num prédio junto à praia. O prédio é habitado por um conjunto de personagens aos quais estão associados pecados capitais e veniais. Ao longo desses oito dias, “os últimos sete de um ano e o primeiro de outro”, cada pecado impele impiedosamente a respetiva personagem até uma encruzilhada da vida inspirando-a a tomar uma decisão importante. Aqui não resisto a estabelecer um paralelismo com a ocasião em que o Nuno se decidiu dedicar à escrita. O Nuno conhece bem o alcance da decisão que tudo muda.

O que mais gostei foi da redenção do Menino Bento, do regresso de um enjeitado da vida à mesa dos homens. Esquecemo-nos como basta pouco, um abraço ou um trato digno de ser humano para recuperar almas à deriva. Muito atual e pertinente é a desintoxicação de David do universo de alienação da PORVIR e o seu deslumbramento ao voltar ao mundo dos vivos num prédio alto de um subúrbio junto de uma mulher, uma criança e pipocas.

As Beiras, 20 de Junho de 2013